“CAPITÃO Salgueiro Maia, a maior vítima de um GOLPE MILITAR "ESQUERDISTA" que ele próprio, DE BOA FÉ…comandou”.
In “Jornal PÚBLICO de 25.4.1999” (A.G.)
O HERÓI DAS CAUSAS NOBRES
…Teve o poder na ponta dos canhões das viaturas blindadas, milhares e milhares de pessoas a aclamá-lo e aos seus soldados, Marcelo Caetano a pedir-lhe um general a quem entregar o poder. No princípio da semana, porém, Fernando SALGUEIRO MAIA, então com 29 anos (nascera em 1944), já havia regressado à Escola Prática de Cavalaria, em Santarém. Sobre os ombros, os mesmos galões de CAPITÃO com que partira, quatro dias antes, para a capital (Lisboa), para cumprir a missão de pôr fim a um regime de 48 anos.
…Era o princípio da tarde de 25 de Abril de 1974, no Largo do Carmo, em LISBOA, mas ele já sabia que o golpe que comandava, no terreno, iria dar em revolução. “Temos todas as viaturas blindadas do Exército português do nosso lado”, começara por responder, numa conferência de imprensa improvisada ali, entre duas ordens de rendição à GNR e uma olhadela emocionada aos civis que enchem os passeios, se debruçam das janelas e das varandas, fazem vergar os ramos das árvores. “E temos o povo”, atalha o tenente Beato. “…E temos o povo”, aceita Salgueiro Maia, como quem já não sente necessidade de sublinhar o óbvio: acabara de receber, na Rua Nova do Almada, “a maior apoteose que as Forças Armadas devem ter ouvido”.
…Nas raras entrevistas que concederá nos anos seguintes, lá vem a recordação emocionada daquele percurso de poucas centenas de metros entre o Terreiro do Paço e o Chiado. “Abaixo a guerra colonial! Abaixo a censura! Viva a liberdade!”, gritam centenas, milhares de pessoas, envolvendo os cadetes e instruendos em fim de instrução, travestidos de atiradores especiais, e as dez viaturas blindadas com cinco munições cada uma com que Maia dominara a PSP, um esquadrão de Cavalaria 7 e uma força de carros de combate M47 sob o comando de um Brigadeiro.
…As vicissitudes do processo revolucionário recorreriam ainda aos seus serviços, mas em 11 de Março e em 25 de Novembro de 1975 considerá-lo-ão “perigoso anticomunista”, uns; “protector de comunistas”, outros. Recebe de cada um dos lados opostos convites para o EXÍLIO.
…Os poderes militares que se sucedem começam por o colocar nos AÇORES, logo em 1976, numa clara manobra para o afastarem dos centros de decisão político-militar. Retiram-lhe o comando de tropas. Querem humilhá-lo, colocando-o num presídio, em substituição de um Sargento-Ajudante. Deixam-no anos e anos sem poder voltar à sua EPC, a escola-mãe deste filho e neto de ferroviários, que entrou aos 20 anos na Academia Militar para “defender a fé e o império”; se alistou nos comandos porque “a guerra é para se fazer a sério” e assim fez no Norte de MOÇAMBIQUE e em terras Guineenses de GUIDAGE; e arrancou para a Capital, naquela madrugada de quinta-feira, para “devolver a dignidade ao Povo Português”.
…Não quis ser Conselheiro da Revolução. Não quis ser Ministro. Recusou o comando da EPC. Queixou-se, nas últimas declarações públicas, da corrupção, do compadrio, do “circo do poder”. Ao ponto de admitir o exílio. Ele que, na manhã da libertação, no Terreiro do Paço, a um jornalista e antigo colega de liceu que lhe perguntava de que sentido político era o golpe respondera simplesmente: “Não tiveste que ir para o estrangeiro por causa da censura? Viemos para a rua para que ninguém mais precise de sair de PORTUGAL por causa do que pensa”.
…MORREU amargurado, o herói das causas nobres. E com ele um pouco de nós também.
…Foi, seguramente, o mais puro dos revolucionários do 25 de Abril. Movimento em que se empenhou desde a primeira hora. E em que nunca mais deixou de se considerar implicado. Reafirmou-o, no seu último desejo: que os seus camaradas e amigos cantassem o “Grândola”, na hora da despedida final, que o destino, após uma doença cancerosa de 3 anos, marcou para o cemitério de Castelo de Vide, sua terra natal, era o dia 4 de Abril de 1992.
...Tinha 47 anos!
Fontes: Jornal PÚBLICO de 1999/fotos Google/Joseph.
Sem comentários:
Enviar um comentário